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Dia bão acontece a qualquer hora


Texto do Batata assinado em 10 de janeiro de 2002


Eram cinco, nem mais e nem menos. O primeiro vinha logo depois do cafezinho da manhã. O segundo completava o almoço, lá pelas nove meia. O terceiro, arrematava a matula das duas horas da tarde. O quarto se misturava com o gosto do melado com mandioca cozida, sobremesa da janta. O quinto trazia o sono para o repouso da noite.
Eram cinco cigarrões de palha, todo dia. Toim João era tão viciado nos horários quanto no fumo de corda. Não que fosse metódico, mas acostumou daquele jeito desde mocinho. Outro jeito seu era o de sentar no banquinho da porta da casa, quando a tardinha não chovia, colocar um dos pés na beirada do assento do banco e ficar, vagarosamente, passando o indicador por entre os dedos do pé. Não era cocheira, mas, talvez um cacoete que acalmava as canseiras do dia. Era tão gostoso que, muitas vezes, ele apoiava o queixo no joelho ossudo e parecia cochilar. Os dois meninos e a menininha, seus filhos, brincavam perto dele, na terra batida e bem varrida.. Da cozinha chegava o canto da mulher. Amava aquela voz. Na capela, quando eram namorados, vivia momentos de Paraíso ao escutá-la cantar ladainhas. Pensou :
“ Eu mais devia ter aprendido tocar viola, memo violão, pra ficar mais perto desse canto .”
Aquela era a hora que os passarinhos começavam a voltar para os ninhos. O primeiro a cantar por perto era um sabiá laranjeira .Pousava no grande abacateiro e abria o peito. Chegava a dar vontade de chorar na gente. Casais de pombas-do-ar passavam em direção da serra. No tempo das maritacas, a paineira centenária abrigava um pandemônio. “Gorquipa”, o cachorrinho meio paqueiro do Toim João quase enlouquecia nessa ocasião. Latia de perder o latido. Bom era virar para a direita e ficar reparando na malemolência das garças que iam se juntando na parte mais brejosa do açude. Era só ver a cena para o Toim João lembrar do tempo que colheu algodão lá no norte da Bahia...
Era mineiro. Foi, com um primo, o Pedro, tentar a sorte na Bahia. Coisa de moço. Ficou por lá dois anos. Voltou correndo, e acabou se assentando na região de Altinópolis - SP.
Enfim ...
Compadre Chico vez ou outra vinha conversar naqueles fins de tarde. Quase não variavam o assunto, apenas gostavam daquele sabor que a conversa tem em si mesmo...
Esse dia, Toim João sentia uma força adicional no peito. Alguma coisa que esperneava para sair. Quando viu, já tinha falado:
“ A minha mulher Maricota canta muito mais melhor do que o padre Geraldo”.
Riram.
O caipira, alma limpa, saiu dos horários e pitou um cigarro extra. Tem dia que é melhor do que os outros...

Um comentário:

  1. Mais uma pérola do Batata. Que bom, Zé, ter mais esse "registro documentado"...Lindo!

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